Um jornalista, enviado especial, depois de uma coletiva do líder espiritual tibetano,
Dalai Lama, faz uma pergunta. Na resposta, Dalai Lama diz-se surpreso com essa
contradição do ser humano, acabar com a saúde para ganhar dinheiro, gastar
dinheiro para tentar recuperar a saúde. A preocupação com o futuro, poder-se-ia
acrescentar também os fantasmas do passado, que impedem cada pessoa de perceber o
presente, o aqui e agora. Como essa projeção do futuro e lembranças do passado,
que muitas vezes são pessimistas, embaçam a percepção do presente. Fica claro o
contraste entre existir automaticamente e viver. É como se tudo fosse um sonho,
onde se acorda durante a noite, tem-se consciência, por um breve tempo, mas
volta-se a dormir no torpor daquele sono reconfortante e reparador. A
consciência pode ser como um corte na carne, quanto mais profunda, mas se sente
dor. Inconscientemente, mesmo sem saber expor em palavras, todos sabem que a
vida não é vivida como realmente deveria ser. As pessoas são envolvidas,
sutilmente, por esse sistema que já está aí há muito tempo. A grande questão é:
como romper isso. Essa vontade de romper,
de acordar, vai definhando-se
espasmodicamente, até se diluir nesse todo frenético de ilusões que nos
distraem, e as futilidades estonteantes
que ofuscam esse despertar. Como as pessoas que reduzem a velocidade do carro,
quando passam perto de um acidente trágico, fazem uma reflexão rápida, pensam
no valor da vida, depois, seguem em frente, acelerando, seguindo a rodovia, esquecendo
que a vida e breve e finita. É um efeito "passageiro" no motorista, e a consequência será cobrada, não pelo cobrador de ônibus. Viver como se nunca
fosse morrer, pode ser interpretado como se o dia a dia, o trabalho e a rotina,
fosse tão alienante que a pessoa deixa para aproveitar o agora, mais para
frente, no futuro, como se tivesse todo
o tempo do mundo. Esse “agora”, no futuro, poderá não existir, não haverá
tempo. Qual seria a solução?. Fugir para floresta, como aquele homem que abandonou
a vida “civilizada” e passou a viver na floresta?. Solução muito radical. Sistemas religiosos,
escolas filosóficas, etc., podem ser ricos em conhecimento, autoconhecimento,
mas também podem esconder armadilhas. Em muitas, surgem vaidades, dissidências,
sede de poder, muitos são tão vazios por dentro que precisam cobrir esse vazio
com indumentárias, trajes, títulos e símbolos de poder, a ostentação da pedra filosofal. Muitos tentam esse despertar, sozinhos, alguns
podem conseguir, outros podem sentir-se confusos nos labirintos da mente. O
desfecho dessa tirinha é bem tenebroso, mas, ao mesmo tempo, muito revelador e
reflexivo: morrer sem realmente nunca ter vivido, apenas existido. Isso que faz
o jornalista refletir, de enviado especial, para cobrir a entrevista do Dalai
Lama, além da jornada, da viagem, há uma jornada interior, tudo que impressiona
o Dalai Lama, essa contradição, incoerência, é a vida nua e crua do jornalista, não apenas
dele, mas de quase todos, de várias profissões (algumas devem aproximar a pessoa com esse despertar, com o presente). É uma crítica bem discreta. Uma
surpresa pode ser boa ou desagradável. Além de despertar, manter-se “acordado”
é muito difícil. Muitas vezes, estamos no piloto automático, quando tentamos
assumir o controle (aqueles lampejos de pensamentos intermitentes, como avisos de alerta em vermelho do painel), o avião já está caindo de bico... Essa queda pode ser por falta de ânimo
(combustível). Nem tudo está perdido, se houve um paraquedas, e o tempo que durou
a queda até a terra firme, foi o tempo que existiu consciência do presente, e pôde
senti-lo, o aqui e agora. Difícil será manter-se acordado, quanto tocar o chão. Claro, esse controle pode ser também feito evitando a queda do avião, sem precisar do paraquedas...
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